Na obra está patente a contínua vontade do povo do enclave em desligar-se de Angola, já que Cabinda é considerada pelo Governo de Luanda uma província angolana. A DW África entrevistou o autor do livro:
DW África: Por que motivo decidiu publicar este livro?
Padre Raúl Tati (PRT): Era uma necessidade, de primeiro, salvaguardar a memória coletiva da nossa igreja e do nosso povo. Era preciso fazer a recolha de várias coisas que foram acontecendo e no contexto do período histórico que estamos a referir, para fazer um documento que fosse importante para os que farão pesquisa em relação a Cabinda, à sua igreja e ao seu povo. Segundo, não deixar que os factos que ocorreram possam cair na amnésia coletiva.
DW África: O percurso da igreja católica em Cabinda é complicado?
PRT: Muito complicado, daí também a pertinência de ter buscado algumas verdades que não eram conhecidas relativamente a este percurso, para que as pessoas saibam por que razões Cabinda tardou a ser diocese e em que circunstãncia se tornou diocese.
DW África: E também é uma igreja marcada por grande interferência política?
PRT: Desde sempre com grande interferência política, mesmo na Era colonial portuguesa, em que Cabinda deveria ser apenas um Protetorado, tívemos casos em que o Arcebisbo Dom Manuel da Costa foi deportado para Portugal, onde esteve exilado até 1974. Para dizer que sempre houve esta interferência política que se agudizou a partir de 1975 com a invasão de Cabinda pelo MPLA e outros movimentos de libertação de Angola.
Cabinda está fisicamente separada de Angola, como se vê no mapa
Cabinda está fisicamente separada de Angola, como se vê no mapa
DW África: Qual tem sido o contributo da Igreja Católica na luta pela independência do povo de Cabinda?
DW África: Há um documento, que se tornou praticamente no mote nesta obra, que é "Não podemos deixar de falar". Este documento foi subscrito por cinco sacerdotes autóctones de Cabinda em 1975, altura em decorria praticamente o Acordo de Alvor. E esse documento pede às organizações internacionais, no caso também as Nações Unidas, Organização da Unidade Africa e ao próprio Vaticano, que tenham atenção particular por Cabinda na medida em que estava a ser cobiçada e assistia-se a uma invasão militar do território. A partir daí os padres assumiram estar do lado do seu povo e bater-se ao lado dele por uma emancipação política, neste caso no contexto da descolonização que estava em curso. Infelizmente esse desejo não foi correspondido por interesses geo-estratégicos. E devo dizer que nos últimos anos os padres sempre procuraram uma solução pacífica do conflito que opõe Cabinda a Angola.
DW África: A população continua a manifestar o seu desejo pela independência?
PRT: A vontade da independência não pode ser prescrita, ela continua e, aliás, com mais força ainda, porque quanto mais aumenta a repressão, mais os sentimentos de independência se fazem sentir. De tal modo que, embora haja um clima político muito apertado em Cabinda, de uma autêntica asfixia das expressões políticas de Cabinda, sabemos que a vontade da independência continua muito forte.
A FLEC é o Movimento que luta pela independência de Cabinda em relação a Angola
A FLEC é o Movimento que luta pela independência de Cabinda em relação a Angola
DW África: No seu livro manifesta a intenção de erguer o enclave no conjunto das nações...
PRT: Com certeza, essa sempre foi uma aspiração do povo de Cabinda e eu não posso fugir dessa aspiração. Simplesmente o que está plasmado no livro é o que sinto e é o que sente o povo de Cabinda.
DW África: Já foi preso em janeiro de 2010. Continua a ser pressionado pelo regime de Luanda?
PRT: Nenhum ativista cívico em Cabinda se sente livre das pressões das autoridades angolanas. Todos nós somos alvos a abater, temos consciência disso, porque somos incómodos. As pressões fazem-se sentir em várias dimensões, por exemplo, de não termos acesso à comunicação social em Cabinda, não podemos ir à rádio dar uma entrevista, não temos direito a fazer manifestações, não temos direito à associação cívica, foi banida a associação Mpalabanda. Portanto, não temos espaço para fazer valer nenhum direito de cidadania.
DW África: Voltamos de novo ao título do seu livro "Cabinda: Percurso histórico entre Deus e Cesár, de 1975-2012". Quem é Cesar?
PRT: Cesár representa os poderes temporais, os poderes políticos que destroem, que trazem sofrimento, dor e morte junto das pessoas. Neste caso estamos a falar dos políticos.
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