domingo, 15 de novembro de 2015

CRONOLOGIA: Caso dos 17 activistas acusados de preparar uma rebelião em Angola



A 14.ª Secção do Tribunal Provincial de Luanda, em Benfica, inicia na segunda-feira o julgamento dos 17 activistas acusados de prepararem uma rebelião e um atentado contra o Presidente angolano, 15 dos quais estão em prisão preventiva desde Junho.




Na Livraria Kiazele, adstrita à residência do professor universitário Alberto Neto, na Vila Alice, Luanda, realiza-se, segundo a acusação deduzida pelo Ministério Público, a primeira sessão de um "curso de formação de activistas" para formadores. Este curso teria lugar todos os sábados, durante três meses, com base no livro do professor universitário Domingos da Cruz "Ferramentas para destruir o ditador e evitar nova ditadura, filosofia da libertação de Angola", adaptação da obra "From dictatorship to Democracy", de Gene Sharp, que inspirou as revoluções da denominada "Primavera Árabe".

20 de Junho 2015:

Operação do Serviço de Investigação Criminal (SIC) da polícia angolana detém cerca das 13:00, na Livraria Kiazele, 13 jovens activistas, alegando flagrante delito no envolvimento em "atcos tendentes a alterar a ordem e a segurança pública", conforme comunicado divulgado no mesmo dia.
Foram detidos nessa operação, na sexta sessão de formação levada a cabo por este grupo de jovens designados de "revolucionários", Henrique Luaty Beirão, Manuel "Nito Alves", Afonso Matias "Mbanza-Hamza", José Gomes Hata, Hitler Jessy Chivonde, Inocêncio António de Brito, Sedrick Domingos de Carvalho, Albano Evaristo Bingocabingo, Fernando António Tomás "Nicola", Nélson Dibango Mendes dos Santos, Arante Kivuvu Lopes e Nuno Álvaro Dala, Benedito Jeremias.

21 de Junho 2015:

Professor universitário Domingos José da Cruz é detido em Santa Clara, no sul de Angola, junto à fronteira com a Namíbia, segundo a acusação, "em fuga" do país.

24 de Junho 2015:

O tenente das Forças Armadas Angolanas (Força Aérea) Osvaldo Caholo é detido pelas autoridades, mediante mandado de captura, no mesmo processo de investigação do SIC.

25 de Junho 2015:

A Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola informa, em comunicado, que o grupo de 15 jovens activistas estava a preparar um atentado contra o Presidente da República e outros membros dos órgãos de soberania. Acrescenta que a conduta dos detidos configurava actos preparatórios para o cometimento do crime de rebelião, adiantando que foi decretada a prisão preventiva "por inconveniência da liberdade provisória".

Os encontros tinham como objectivo, segundo a PGR a formação de formadores para mobilizar a população de Luanda para uma insurreição e desobediência colectiva, com a colocação de barricadas nas principais artérias da cidade capital e a queima de pneus em locais de maior afluência de cidadãos estrangeiros, nomeadamente o aeroporto internacional 4 de Fevereiro.

Nas buscas e revistas foram apreendidos na posse dos detidos computadores portáteis, ‘pen-drives', telemóveis, entre outros objetcos "com conteúdo suspeito".

02 de Julho 2015:

O Presidente angolano e líder do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), partido no poder, afirma, numa alusão a este caso, que "não se deve permitir" que o povo "seja submetido a mais uma situação dramática como a que viveu em 27 de maio de 1977", aludindo à morte de milhares de pessoas numa alegada tentativa de golpe de Estado. "Quem quer alcançar o cargo de Presidente da República e formar Governo, que crie, se não tiver, o seu partido político, nos termos da Constituição e da Lei, e se candidate às eleições. Quem escolhe a via da força para tomar o poder ou usa meios para tal anticonstitucionais não é democrata. É tirano ou ditador", disse José Eduardo dos Santos.

15 de Julho 2015:

Defesa apresenta no Tribunal Supremo de Angola um ‘habeas corpus', solicitando a libertação dos 15 activistas, por alegadas ilegalidades na detenção.

29 de julho 2015:

A polícia angolana carrega sobre algumas dezenas de manifestantes que exigiam em Luanda a libertação de 15 ativistas detidos desde Junho, com várias detenções. O protesto concretizou-se no Largo da Independência, com os jovens manifestantes gritando por "Liberdade" e a entrarem naquela área, que registava forte aparato policial e onde já decorria uma acção das estruturas juvenis do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, o partido no poder), envolvendo cerca de duas centenas de jovens. A aproximação entre os manifestantes, do auto-designado Movimento Revolucionário, e aquela juventude partidária levou a polícia de intervenção colocada no local a carregar sobre os mesmos, recorrendo a equipas cino-técnicas, por entre momentos de forte tensão.

01 de Setembro 2015:

A estudante universitária Laurinda Gouveia, de 26 anos, e a secretária Rosa Conde, de 28 anos, são constituídas arguidas no mesmo processo. Ficam a aguardar o desenrolar do processo em liberdade provisória.

10 de Setembro 2015:

A 1.ª Secção da Câmara Criminal do Tribunal Supremo nega provimento ao pedido de ‘habeas corpus', alegando, entre outras disposições, que o período de prisão preventiva dos 15 suspeitos não foi ultrapassado. Os advogados recorrem deste indeferimento para o Tribunal Constitucional.

16 de Setembro 2015:

A acusação, deduzida pelo Ministério Público (MP), é entregue no Tribunal Provincial de Luanda com data de 16 de Setembro. Entre outros crimes menores, os 17 arguidos são acusados, em co-autoria, de actos preparatórios de uma rebelião e um atentado contra o Presidente angolano. Do despacho de acusação nada é referido sobre a situação carcerária dos detidos.

20 de Setembro 2015:

Esgota-se o prazo máximo de 90 dias de prisão preventiva, que pode ser prorrogado, para este tipo de crime, mas com despacho fundamentado do juiz.

21 de Setembro 2015:

O ‘rapper' e activista luso-angolano Luaty Beirão, de 33 anos, inicia uma greve de fome alegando excesso de prisão preventiva e exigindo, juntamente com os restantes detidos, aguardar julgamento em liberdade. Pelo menos outros três detidos iniciam protesto idêntico, que interromperam ao fim de alguns dias.

30 de Setembro 2015:

Advogados dos arguidos apresentam novo ‘habeas corpus' no Tribunal Supremo, igualmente alegando excesso de prisão preventiva. O recurso para o Tribunal Constitucional do indeferimento ao primeiro pedido de ‘habeas corpus' permanece por decidir.

11 de Setembro 2015:

Mais de 100 pessoas que estavam em vigília junto à igreja das Sagrada Família, em Luanda, pedindo a libertação de 15 activistas detidos desde junho, desmobilizam para evitar o choque com a polícia junto ao templo.

O grupo estava rodeado por dezenas de elementos da Polícia de Intervenção Rápida (PIR), incluindo um camião para lançamento de água já posicionado em frente - com as ruas envolventes cortadas ao trânsito automóvel - além de brigadas caninas, conforme a Lusa constatou no local, num ambiente de muita tensão.

14 de Setembro 2015:

Centenas de pessoas concentram-se no Rossio, em Lisboa, para manifestar solidariedade com os 15 presos políticos encarcerados em Angola. "Abaixo a Ditadura" e "Liberdade Já" são algumas das palavras de ordem que se ouvem na vigília organizada no Rossio e que decorre depois de uma concentração defronte do gabinete do Parlamento Europeu, no Largo Jean Monet, em Lisboa.

Este tipo de manifestações e vigílias sucedem-se nos dias seguintes em Portugal, mas também noutros países com presença de comunidade angolana, com apelos à libertação dos jovens e ao fim da repressão em Angola.

15 de Outubro 2015:

Por precaução, devido ao agravar da situação clínica, Luaty Beirão é transferido do hospital-prisão de São Paulo para uma clínica privada, também em Luanda, onde fica sob detenção. O Governo português reitera, através do Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE), que "tem acompanhado a situação de Luaty Beirão de perto e desde a primeira hora, particularmente tendo em conta os seus contornos humanitários".

Em comunicado, o MNE sublinhou que "este acompanhamento tem sido feito de forma mais próxima através da embaixada de Portugal em Luanda, a nível bilateral e em coordenação com a delegação da União Europeia na capital angolana e com as demais embaixadas dos Estados-membros da UE".

19 de Outubro 2015:

Advogados e os 17 arguidos são notificados do início do julgamento, com cinco sessões agendadas para o Tribunal Provincial de Luanda, em Benfica, entre 16 e 20 de Novembro. Na mesma altura foram notificados do despacho de pronúncia pelo tribunal, que manteve inalterada a acusação do MP e as medidas carcerárias.

Os 17 jovens, com idades entre os 18 e os 33 anos, são acusados da preparação de uma rebelião e de um atentado contra o Presidente da República, prevendo barricadas nas ruas e desobediência civil que aprendiam num curso de formação.

21 de Outubro 2015:

A Amnistia Internacional é recebida em Lisboa pelo ministro dos Negócios Estrangeiros português, Rui Machete, para abordar a situação do "presos de consciência angolanos e a situação de direitos humanos em Angola", exigindo a imediata libertação dos 15 activistas.

Em Luanda, representantes diplomáticos de embaixadas de países da Europa, incluindo de Portugal e da União Europeia, reúnem-se no hospital-prisão de São Paulo, na capital angolana, com 14 dos activistas (Luaty Beirão encontra-se numa clínica, em greve de fome) que se encontram desde Junho em prisão preventiva.

"No que concerne à situação dos defensores dos direitos humanos e outros activistas no país, a União Europeia tem desenvolvido esforços reiterados e tem pugnado pelo cumprimento das garantias processuais previstas na lei angolana", afirmou, no final, a chefe da secção política da Delegação da União Europeia em Angola, a portuguesa Joana Fisher.

22 de Outubro 2015:

O embaixador de Portugal em Luanda, João da Câmara, reúne-se com o activista Luaty Beirão, sob detenção e em greve de fome numa clínica da capital angolana, mas sai daquela unidade sem prestar declarações, ao fim de 20 minutos. "O Embaixador de Portugal em Luanda pôde testemunhar que Luaty Beirão estava lúcido e a discorrer com clareza, e, tanto quanto é possível aferir numa visita, a ser bem acompanhado em termos médicos", anunciou no mesmo dia, em comunicado, o MNE português.

25 de Outubro 2015:

O embaixador angolano em Lisboa acusa Portugal de utilizar o caso dos 15 activistas detidos em Luanda como "pretexto" para voltar a "diabolizar Angola", ironizando que no país se fala mais de Luaty Beirão do que do Papa.

Condena ainda a "insistente diabolização de Angola" por parte de alguns "sectores maléficos" da sociedade portuguesa: "O problema do cidadão Luaty Beirão [um dos 15 activistas em prisão preventiva desde Junho] é apenas um pretexto para fazer ressurgir aquilo que em Portugal sempre se pretendeu: diabolizar Angola", apontou o embaixador José Marcos Barrica.

No mesmo dia, o Jornal de Angola afirma, em editorial, que a visita do embaixador português em Luanda ao activista angolano Luaty Beirão abriu "um precedente grave" e que acabou por "legitimar toda a ingerência personificada nas manifestações em Portugal". Assinado pelo seu director, José Ribeiro, o artigo do jornal estatal recorda que sobre "esse cidadão" pendem "acusações gravíssimas" de "envolvimento em actos de perturbação de ordem pública em Angola, no quadro de uma acção mais vasta de transformar o país numa nova Líbia em África".

26 de Outubro 2015:

O general e dirigente do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) Bento dos Santos 'Kangamba' acusa Portugal de ingerência nos assuntos angolanos, avisando que Lisboa não tem "consciência jurídica e política". "Se eu fosse português pensava 20 ou 30 vezes antes de falar sobre um estrangeiro.

"Primeiro tenho que arrumar a minha casa e depois falar sobre os outros. Portugal é um grande país, tem grandes políticos, mas neste momento está em debandada, não tem consciência jurídica e política para se defender nem defender os angolanos. Há necessidade de haver calma que a Justiça será feita", aponta o general 'Kangamba', sobrinho do Presidente angolano, José Eduardo dos Santos, e tido como o homem forte da mobilização das estruturas do partido no poder.

27 de Outubro 2015:

O activista luso-angolano Luaty Beirão anuncia, numa carta, que termina a greve de fome, ao fim de 36 dias e quando já tinha perdido 23 quilogramas, garantindo que não desiste de lutar, decisão que surge depois de vários apelos nos dias anteriores:

"Estou inocente do que nos acusam e assumo o fim da minha greve. Sem resposta quanto ao meu pedido para aguardamos o julgamento em liberdade, só posso esperar que os responsáveis do nosso país também parem a sua greve humanitária e de justiça", lê-se na carta.

03 de Novembro 2015:

Luaty Beirão já ingere uma refeição sólida por dia, no processo de realimentação após o período de greve de fome. É transferido pelos serviços prisionais de regresso ao hospital-prisão de São Paulo, em Luanda, onde permanecem os restantes 14 colegas ativistas.

04 de Novembro 2015:

O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) critica a "pressão" estrangeira sobre as autoridades angolanas no caso dos 15 activistas, dizendo que é tempo de "cerrar fileiras" em torno do Presidente angolano.

A posição surge num comunicado do 'bureau' político do Comité Central do MPLA, após reunião orientada pelo líder do partido e Presidente da República, José Eduardo dos Santos, que o documento refere ser um dos visados da "atitude de pressão" de "círculos nacionais e internacionais" para libertação de "cidadãos formalmente acusados de actos preparatórios de rebelião, com o objectivo de derrubar, de uma forma anticonstitucional, o Governo legitimamente constituído em Angola".

09 de Novembro 2015:

Em entrevista à Lusa, o recém-nomeado embaixador itinerante angolano António Luvualu de Carvalho, diz que os ativistas queriam provocar uma intervenção da NATO e considerou que os portugueses que criticam o regime são cabeças ocas.

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